Identificação e Características do Objeto
Miniatura

Acervo
Acervos Transcestrais
Número de Tombo
165
Número de Registro
MUTHA.AH.AD.AT.DC.2024.0165
Objeto
Fotografia Digital de Obra de Arte
Título
O Renascimento
Autoria
Pintura Demétrio Campos, Fotografia digital Ian Habib
Identidade e Subjetivação
20 de Maio de 1996 (Demétrio Campos) | Afro-Indígena (Demétrio Campos) | Homem Transmasculino (Demétrio Campos) | Ivoni Campos: “Primeiro transmasculino quilombola do Brasil, pesquisei e não localizei outros” | Macaé/Rio de Janeiro (Demétrio Campos) | Quilombola (Demétrio Campos)
Descrição Intrínseca
Fotografia colorida, de uma pintura com traços marcantes e grossos na cor preta em formato oval. No centro, um corpo de pele escura, envolto por círculos azuis e manchas vermelhas, ergue o braço direito.
Dimensões
899 x 1.599 pixels
Material
Digital
Origem
Pintura feita em Tamoios (Terra Indígena e Quilombola)/Cabo Frio/RJ
Procedência
Tamoios (Terra Indígena e Quilombola)/Cabo Frio/RJ
Observações
Pintura feita com carvão e giz de cera.
Tipo de Aquisição
Doação
Pessoa ex-proprietária
Ivoni Campos
Data de Aquisição
janeiro 1, 2025
Estado de Conservação
Bom
Classificação Etária
Maiores de 18 anos
Informações Contextuais
Descrição Extrínseca
“Essa pintura aí tem história. Não sei se vocês dão pra ver. Essa pintura, ela é muito forte. [...] Ele falava que ele pintou isso aí que ele sentia todo o corpo dele como se ele estivesse dentro de um buraco escuro. [...] Demétrio, quando pintou isso aí ele falava pra mim “Mãe eu me sinto como se eu estivesse saindo dentro de um buraco escuro. De um lugar preto, sabe? Escuro. Como se fosse renascer.” Você pode notar aí que é um bonequinho. É um corpo. Entendeu? É um corpo. Ele dava assim. É igual as outras telas que tem aqui em casa. Ele pintava. Cismava, mas ele pintava. [...] Essa pintura é... Ela tem um... Sabe... Eu olho pra ela, eu sinto uma dor muito grande. [...] Todas as pinturas de Demétrio, a maioria das pinturas dele, ele pintou, parece que ele expressava o que ele sentia dentro do... pra dentro da pintura, entendeu? [...] Tem um diário dele, o Ian, ele fazia aquele tipo de pinguinho. Eu não sei o nome que dá. Quando você faz pinguinho, desenhos com pinguinho com uma caneta… [...] Isso, pontilhismo. Demétrio tem um diário todo de desenho pontilhismo. [...] Pontilhismo, desenho de pontilhismo. Esse diário, ele era compartilhado com Isabelle, que era a namorada dele. Eu entreguei pra ela, mas ela me deu a parte toda em PDF. Ela escaneou e me mandou e falou “Ivoni”. A parte das pinturas que ele fez, ela mandou pra mim. Ela ficou só com a parte da escrita, entendeu? Eles compartilhavam afeto entre eles dois. [...] Demétrio sempre foi apaixonado por... Demétrio era muito piranhudo. Entendeu? Piranhudo. Não podia ver uma mulher que caia dentro. Entendeu? Mas o amor da vida dele era Isa. Entendeu? Ele morreu falando na Isa, sabe? Ele tava no relacionamento com a Clara, ficando com a Clara, mas o amor da vida dele era Isa. Sabe? Eles namoraram durante quase oito anos. [...] Tempo. Sim. Aí a Clara entrou na vida do Demétrio. A Clara fez muito bem pro Demétrio, entendeu? Mas o Demétrio já tava no processo de depressão tão difícil, que pra lidar com uma pessoa depressiva, eu acho que só a mãe ou alguém mesmo. Porque nem todo mundo consegue lidar. E a Clara tava focada na vida dela, né? Tanto, tanto, que ela ta lá fazendo novela, brilhando na tela. Entendeu? E ela ta certa em viver. [...] Essa pintura foi feita aqui em casa, entendeu? Essa pintura, não sei se você notou aí, eu tenho quase certeza que não foi feita com aquele... Giz não, foi com carvão, entendeu? [...] Carvão, carvão, entendeu? Não sei da onde que Demétrio arranjou o carvão, não sei se foi daqui dos que sobrou no churrasco, porque eu peguei ele pintando esse negócio todo carvão, toda a cagada de carvão. [...] O colorido, se eu não me engano, acho que foi giz de cera. [...] Entendeu? Mas eu tenho quase certeza que foi carvão. Porque eu peguei e falei “Demétrio tá com essa mão toda preta assim?” Porque ele tava todo carvão. Depois que... O quarto dele ficava trancado. Ele não gostava que Letícia entrava lá, porque Letícia ia fumar a maconha dele. [...] Quando ele saía, ele pegava a chave e botava no meu pescoço, porque eu limpava o quarto, entendeu? Eu falava, “Mãe, você vai limpar o meu quarto? Bota a chave no pescoço, mas fica com a chave no pescoço, para Letícia não pegar a minha maconha.” [Risos] [...] E isso aí, eu ia limpando, olhando, bisbilhotando as coisas. [...] Olha, se eu não me engano, eu acho que foi 2020 também. Porque… [...] Foi. Foi porque ele não tinha nada para fazer na pandemia. Entendeu? O Demétrio passava, o Demétrio escrevia. O Demétrio rabiscava as coisas. Tô falando que a minha parede daqui de fora está toda pintada de tinta. Tinha umas latas de tinta, resto de tinta que sobrou. Entendeu? Ele não tinha nada para fazer. Começou a botar a marca das mãos na parede. [...] Ele cismava com as coisas. Olha, o Demétrio andava com gambá. Apareceu com um gambá aqui em casa. [...] Gambá. Eu tenho uma foto dele com um gambá nas costas. [Risos] [...] Sim. Ele gostava de bicho. Ele vivia no meio do mato. Eu tenho uma foto dele com os cachorros. Entendeu? Do vizinho aqui. Então, durante a pandemia que ele passou aqui, no começo da pandemia que ele veio de São Paulo, ele até que ficou bem, evoluiu bem. Mas o que mais que acabou com a cabeça do Demétrio foi acessar a internet. Entendeu? Eu falava para ele, “Demétrio, sai da internet! Demétrio, sai da internet!”. Toda vez que ele usava o Instagram, que ele entrava no Twitter, ele saía de lá mais destruído. A cabeça dele parecia que ia explodir. [...]Entendeu? Sim. E foi regredindo, regredindo, regredindo a ponto de ele chegar e ficar trancado no quarto. Ficar trancado. De eu implorar para ele abrir a porta. [...] Eu acho que todos os homens transmasculinos passam por isso, Ian. Principalmente os pretos. É aquilo que o Demétrio falava, que quando você sai do corpo de um sapatão, você transiciona, entendeu? E você passa pelo processo da masculinidade tóxica, que é representatividade paterna. Entendeu? A gente foi ensinado, eu também fui ensinada, como mulher cis foi ensinada, que a gente tem que ser forte o tempo todo, que a gente tem que suportar tudo, que a gente tem que aguentar tudo. E a mesma coisa é o homem transmasculino. Entendeu? Ele vem... Dentro de casa, o Alex, o pai dele, é um homem chucro, bruto, burro, ignorante. Entendeu? O Demétrio cresceu vendo isso. Você cresce vendo aquilo ali. Você não aprende que você pode chorar, que você pode ser fraco, que você pode ser frágil. Entendeu? Eu vejo isso e eu aprendi muito, muito. Hoje não, porque eu me recolhi um pouquinho. Eu estou tentando cuidar de mim, da minha saúde mental, entendeu? Mas eu já fui ouvida, escuta, de muitos meninos, de muitas meninas, que
chegaram para mim e falaram... “Tia, aconteceu isso e isso dentro da minha casa. Aconteceu assim, assado. Eu me sinto desse jeito, entendeu?” Por quê? Porque, querendo ou não querendo, isso é que muda a personalidade da pessoa. Isso influencia, entendeu? A masculinidade tóxica. E isso adoece. E a gente fica pensando dentro da gente... Nossa, eu tenho que ser forte o tempo todo. Entendeu? “Eu não posso chorar porque eu sou homem, eu sou macho.” Entendeu? E não é assim. Não é assim. O ser humano tem sentimento. O ser humano pode chorar, ele pode se sentir triste, se sentir feliz. Eu penso que o nosso corpo, o nosso psicológico, é um mundo de variações, de sentimentos psicológicos e hormonais também.[...] É um mix, né? Eu vou falar assim. [...] Mix, entendeu? E você bota pra fora. Tem que botar pra fora. Porque se a gente não colocar... Aí ficam me falando, “homem chorando é feio.” Eu já ouvi piada de gente falando, olha lá, entendeu? “Chora porque é mulher, porque é mulher que virou homem.” Eu já ouvi piada disso. [...] Eu penso sobre isso, que isso é uma violência, entendeu? É uma violência que já é partilhada da nossa…(Ivoni Campos, Acervos Transcestrais, 2024)
Período
2020
Referências Bibliográficas
Não
Objetos Associados
MUTHA.AH.AD.AT.DC.2024.0169
Publicações
Não
Restauro
Não
Pesquisas
Pesquisa realizada pelo Museu Transgênero de História e Arte - Mutha para a construção das coleções pertencentes ao eixo temático Acervos Transcestrais, contemplada por meio do edital Funarte Retomada Ações Continuadas - Espaços Artísticos 2023.
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Observações
Não
Registrado por
Beatriz Falleiros | Ian Habib | Mayara Lacal
Data de Registro
fevereiro 19, 2025