Documento
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MUTHA.AH.AD.AT.TC.2024.119
Identificação e Características do Objeto
Acervo
Acervos Transcestrais
Número de Tombo
119
Número de Registro
MUTHA.AH.AD.AT.TC.2024.0119
Objeto
Vídeo Digital
Título
Feminilização Facial: Toda feita, toda quebrada
Autoria
Desconhecida
Identidade e Subjetivação
Dimensões
480 x 848 pixels
Material
Digital
Origem
Antiga casa da Taya Carneiro, Asa Norte, Brasília, DF
Procedência
Brasília, DF
Observações
Não
Tipo de Aquisição
Doação
Pessoa ex-proprietária
Maria Léo Araruna
Data de Aquisição
janeiro 1, 2025
Estado de Conservação
Bom
Classificação Etária
Livre
Informações Contextuais
Descrição Extrínseca
“Esse dia em específico eu não me lembro muita coisa. Eu acho que é só mais um dia em que a gente se costumava se reunir na casa delas. Eu sempre ia pra casa delas. Elas moravam juntas, a Taya, a Vida e a Lua. E a gente ia pra lá e a gente ficava fumando maconha, bebendo, conversando, vendo vídeo, vendo drag race, vendo clipe. E aí eu acho que esse vídeo simboliza mais esse processo da Taya, de que ela queria desde sempre, desde o início da transição dela, que ela tinha muita disforia com o rosto dela, com o maxilar dela e com a testa dela principalmente. Com essa parte aqui, desse ossinho aqui. E ela queria muito raspar. E aí ela, depois de muitos anos, conseguiu juntar dinheiro e fazer a feminilização facial que ela sempre quis. E aí eu acho que esse vídeo representa mais esse resultado dela, porque ela tá com um suporte, né? Que tem pra proteger o rosto. E aí a gente sempre falava “Nossa, Taya, você é muito corajosa, como é que pode, gente? O cara tirou o seu rosto fora, quebrou tudo lá e botou de novo, como é que você tem coragem de passar por tudo isso?” E ela falava na maior tranquilidade que pra ela não tinha problema nenhum, que ela queria fazer e que ela topava, assim. De forma bem tranquila. E ela gostou muito do resultado no início, mas depois ela começou a detestar o resultado. Ela começou a... A criticar de novo o rosto dela, falar que o médico errou e que deixou ela com papa. E aí ela fez depois algumas aplicações de Botox também, pra dar uma levantada. Assim, pra mim eram coisas bem... que não faziam muito sentido, assim, né. Sou eu julgando, mas ela tinha muita disforia. E ela muitas vezes se comparava também com mulheres cis. Isso era uma característica, assim. E isso se voltava pra ela num formato de auto-ódio. E aí essa cirurgia fez bem pra ela, mas logo depois ela não ficou satisfeita, assim. Ela continuou se achando feia.” (Maria Léo Araruna, Acervos Transcestrais, 2024).
“Porque esse apartamento onde as meninas cuidaram da Taya, no pós-operatório da
feminização, foi depois que a Lu e a Taya tinham morrido. A Lu tinha deixado de morar lá. A Vida continuou morando lá por algum tempo, né? De modo que quando a Taya morreu, eu passei a vir em Brasília muitas vezes ao longo de 2022 pra cumprir a agenda de militância, mas também pra participar de um processo de cura coletiva que tava acontecendo nesse apartamento e que esse apartamento também participava dessa cura, né? De alguma forma esse apartamento pra gente era como era como tá com a Taya na medida que esse cuidado tava presente, sabe? Esse cuidado continuava presente com um cuidado com o nosso luto, né? Não necessariamente de forma intencional e consciente sempre. A gente conversava sobre isso abertamente, nunca se tornava um tabu, mas no fato da gente estar juntas, rindo, naquele espaço onde sempre foi marcado vários conflitos, mas também com muito cuidado. E esses conflitos continuavam presentes. [...] E esses conflitos e tensões continuavam presentes, mas o cuidado também. O cuidado uma
com a outra, com o processo difícil que a gente tava vivendo. Eu participei muito ao longo de 2023, depois da morte da Taya. Eu vim muitas vezes ao longo desse ano e continuo vindo. E esse apartamento foi fundamental, assim, pra esse processo. Porque é assim que quando a Taya morreu, eu não pude vir pro enterro, mas pelo que eu pude entender e pelo que me contaram, as pessoas sempre se reuniam lá, assim, nesse apartamento. Se reuniram imediatamente nesse apartamento e continuaram lá por alguns dias. E esse apartamento continuava sendo cada vez mais frequentado pelas amigas da Taya, onde a gente podia celebrar a existência dela. Acho que a Vida uma vez falou uma frase que eu achei muito bonita. Uma forma de entregar a Taya bonita pra Deus, né? Acho que tinha esse lugar, assim. É… [...] Ali a gente tava tentando, de alguma forma, descobrir maneiras de entregar a Taya bonita pra Deus. Eu acho que isso foi bem sucedido. Acho que a construção desse acervo fala disso também, né? Pra mim, eu tava falando com a Maria Leo, acho que a Taya gostaria muito de ser um acervo. Porque ela era uma referência. [...] Mas felizmente ela foi muito reconhecida em vida também, né? Ela nos deu muito orgulho de ser reconhecida em vida pelo trabalho dela na ONU e outros lugares. O trabalho acadêmico dela também é muito valoroso. Ela tinha um blog. Mas era isso, esse comentário. Aí a Vida já se mudou nesse apartamento e... Mas eu sinto que a gente continua se cuidando, assim. [...] Esse apartamento foi muito fundamental no processo, sabe? Já que a Maria foi no banheiro vou continuar. No processo de cura. E é muito engraçado, porque quando eu vim para Brasília, eu perdi duas amigas por suicídio, a Taya e a Kaila. E eu me chamo Caia, né? Então, das duas vezes que... Eu entendi um parafuso sobre essa questão do nome. Porque
frequentemente as pessoas me chamavam de Taya. E no ato falho. E eu desejo de
presença, sabe? E era muito... Tanto quanto assombroso, né? Mas... Esquisitíssimo, assim. Esquisitíssimo. Isso acontecia com frequência. E isso me levava a pensar também em que dimensão de mim iria embora com a Taya, né? Através desse ato falho, eu era obrigado a me perguntar isso. Eu me via na obrigação de o que eu compartilhava com a Taya, além do nome, desse processo. Além da semelhança entre os nomes. Porque eu lembro também que uma vez a gente estava no congresso, eu e a Taya. Aí... A gente sempre andava juntas. Eu, ela, Maria, Léo. E o Bernardo, Mota. Aí, quando chamavam Taya, Taya, as duas olhavam, né? Aí um dia ela virou para mim e falou vamos combinar que a gente tenha o mesmo nome, né? Porque cá é para nós. Então, as duas olhavam, assim. E aí... Quando ela morreu, algumas pessoas passavam no ato falho a me chamar de Taya. E só eu olhava para a trás. E era um processo meio esquisito, assim. Que me levou muitas vezes a me perguntar, tanto no caso da morte da Taya, quanto na morte da Kaila, o que de mim é com ela. E é um processo que eu nunca... Essa pergunta aqui eu nunca vou conseguir responder, assim.” (Caia Maria Coelho, Acervos Transcestrais, 2024)
Período
20 de outubro de 2021
Referências Bibliográficas
Não
Objetos Associados
Não
Exposições
Não
Publicações
Redes Sociais. “Acho que da Lua” (Maria Léo Araruna, Acervos Transcestrais, 2024)
Restauro
Não
Pesquisas
Pesquisa realizada pelo Museu Transgênero de História e Arte - Mutha para a construção das coleções pertencentes ao eixo temático Acervos Transcestrais, contemplada por meio do edital Funarte Retomada Ações Continuadas - Espaços Artísticos 2023.
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Observações
Não
Registrado por
Beatriz Falleiros | Ian Habib
Data de Registro
fevereiro 20, 2025